Quem tem medo do optometrista?
Prof.
Arlindo Costa
A crise paira sobre o exercício do
optometrista, motivada evidentemente por um
corporativismo de uma categoria que há muitas décadas
vem procurando monopolizar a "visão" humana como um
patrimônio único e de posse, ignorando que o olho humano
transcende as barreiras da medicina (Física, Química,
Sociologia, Literatura – Ensaio sobre a cegueira – José
Saramago,...).
A celeuma que a mídia lançou no
Brasil nos últimos dias sobre a possível ilegalidade da
profissão do optometrista permite, antes de mais nada,
uma viagem no tempo, quando o corpo humano era (é)
disputado por "partes". Desde a mais remota antiguidade,
as mulheres eram as curadoras populares, as parteiras,
enfim, detinham saber próprio, que lhes era transmitido
de geração a geração. Em muitas tribos primitivas eram
elas as xamãs. Na Idade Média, seu saber se intensifica
e aprofunda. As mulheres camponesas pobres não tinham
como cuidar da saúde, a não ser com outras mulheres tão
camponesas e tão pobres quanto elas.
Elas (as curadoras) eram as
cultivadoras ancestrais das ervas que devolviam a saúde,
e eram também as melhores anatomistas do seu tempo. Eram
as parteiras que viajavam de casa em casa, de aldeia em
aldeia, e as médicas populares para todas as doenças.
Mais tarde elas vieram a representar uma ameaça. Em
primeiro lugar, ao poder médico, que vinha tomando corpo
através das universidades no interior do sistema feudal.
Em segundo, porque formavam
organizações pontuais (comunidades) que, ao se juntarem,
formavam vastas confrarias, as quais trocavam entre si
os segredos da cura do corpo e muitas vezes da alma. Na
Idade Média, muitas mulheres que assumiam o papel de
"parteiras", foram perseguidas pela Inquisição, Nesse
período, As parteiras, as mulheres que utilizavam ervas,
pessoas que tratavam de dores, muitas e muitas foram
todas queimadas, pois a Inquisição era um grande negocio
(bens confiscados).
A título de esclarecimento para a
opinião pública, convém ressaltar que Optometria é uma
ciência especializada no estudo da visão,
especificamente nos cuidados primários e secundários da
saúde visual, sendo o Optômetra um profissional
independente da área da saúde, com formação superior,
que está habilitado a examinar e avaliar o sentido da
visão, sendo um especialista em identificar e compensar
alterações visuais de origem não patológicas, como:
miopia, hipermetropia, presbiopia, astigmatismo, etc.;
melhorando o desempenho visual e conseqüentemente o
desenvolvimento social e a qualidade de vida da
população.
Além disso, a atuação do Optômetra
é centrada da prevenção da cegueira, problemas oculares
e na correção de disfunções visuais de origem não
patológicas (vícios de refração: miopia, hipermetropia,
presbiopia, astigmatismo, etc.), trabalhando
especificamente sobre o ato visual e não sobre o globo
ocular, realizando um atendimento visual primário e não
uma intervenção de caráter médico, posto que a
Optometria não é uma emanação da Medicina.
Convém ressaltar que o Optômetra
não utiliza qualquer medicamento ou técnica evasiva ao
corpo humano. Todos os equipamentos utilizados são de
caráter observativo e direcionados a avaliação
quantitativa e qualitativa do sentido da visão. Também é
preparado para reconhecer uma alteração visual de ordem
patológica ocular ou sistêmica, encaminhando, nestes
casos, a um profissional da área de médica, realizando
assim seu trabalho de prevenção.
Sobre o exercício ilegal da
profissão, muitas vezes apresentado de forma equivocada
na mídia com implicações sociais, é necessário que a
sociedade brasileira reflita sobre a grave situação na
área de saúde visual, pois 56% de sua população possuem
dificuldades para enxergar devido a alterações visuais
de causas ópticas (refrativas) e não patológicas
(doenças oculares).
Como professor de ensino
fundamental e médio, além de "ancorado" em pesquisas,
sabe-se que as crianças que não enxergam bem têm um
rendimento escolar prejudicado, com elevados níveis de
reprovação, os quais acabam por desestimular a
continuidade de seus estudos. Milhões de adultos têm sua
produtividade reduzida ou até interrompida e os idosos
detêm uma queda brusca de qualidade de vida pela falta
de uso de um simples par de óculos.
A nação brasileira perde muito
dinheiro e talento por questões relacionadas à visão. A
função social do optometrista e a polêmica que paira
sobre o seu papel, permite uma análise do número de
médico oftalmologistas em cada cidade, sendo que em
algumas cidades não existem convênios com o SUS e
Secretarias Municipais de Saúde, ficando a população
desamparada e tendo que recorrer a métodos nada
convencionais (benzimentos, auto-medicação) ou deixar
que o tempo "cure" os problemas. No caso da visão, esse
problema pode ser resolvido de forma rápida e acessível,
através da optometria. Basta uma pequena mudança no
modelo de saúde visual, adotado pelo Governo.
A optometria auxilia na saúde
visual, entretanto não exerce nenhuma atividade médica.
Medicina é saúde. Saúde não é medicina. A saúde não é
privativa de nenhuma profissão. A optometria é a
alternativa mais eficaz e menos onerosa no combate à
baixa qualidade visual de um povo. O Óptico-optometrista
é um profissional não médico que está preparado para
examinar e avaliar a função visual, prescrevendo
soluções ópticas (óculos de grau e de proteção, lentes
de contato, etc) nos casos de miopia, hipermetropia,
astigmatismo, vista cansada (presbiopia), estrabismo, ou
seja, quando a alteração visual não for de ordem
patológica ocular ou sistêmica.
No que se refere às atribuições
das funções, de um lado, o optometrista, é responsável
pela orientação técnica e estética ao usuário de óculos
e lentes de contato. É ele quem adapta os óculos e as
lentes de contato às necessidades do usuário. Do outro,
médico oftalmologista trata do globo ocular e seus
anexos, diagnosticando e cuidando das doenças através de
cirurgias e medicamentos. Ele dedica-se à preservação da
saúde do globo ocular e seus anexos. A atividade desses
dois profissionais somente beneficia toda a população.
Entre os benefícios da optometria
destacam-se:
CUSTO SOCIAL - Enquanto o Estado
leva em torno de 6 anos para qualificar um médico
oftalmologista, um optometrista pode concluir sua
formação técnica em até 2 anos e sua formação superior
em até 4 anos.
FOCO NO PROBLEMA - O optometrista
é preparado para resolver alterações visuais não
patológicas, que representam 90% de todos os casos de
problemas visuais.
MELHOR DISTRIBUIÇÃO - Nos países
que adotaram a optometria, percebeu-se uma melhor
distribuição desses profissionais em regiões longínquas
e de difícil acesso. Isto facilitou o atendimento da
população, principalmente a menos favorecida.
Atualmente, existe 01 oftalmologista para cada 60.000
habitantes no Norte do Brasil, evidenciando a falha no
modelo visual brasileiro.
AUMENTO DA DEMANDA OFTALMOLÓGICA -
Realizando o atendimento primário da visão, os
optometristas encaminham os pacientes portadores de
doenças aos oftalmologistas e estes poderão dedicar-se
integralmente às questões patológicas visuais, para as
quais foram preparados.
POPULAÇÃO MAIS BEM ATENDIDA - A
optometria segundo a Organização Mundial da Saúde é a
responsável pelo atendimento primário da visão. Sua
eficácia é comprovada, inclusive no Brasil, apesar de
forte oposição. Nos EUA existe uma força de 34.000
optometristas e 18.000 oftalmologistas, para atender
toda a demanda visual daquele País. Os dados e a
situação visual da América do Norte atestam que as
soluções dos problemas visuais passam, obrigatoriamente,
pela ciência da optometria.
Numa pesquisa sobre qualidade da
visão, a estatística aponta que O Brasil conta hoje
cerca de cento e setenta refrativos milhões
(170.000.000) de habitantes. Destes, perto de noventa e
seis milhões (96.000.000) de pessoas apresentam erros
como: miopia, hipermetropia, astigmatismo e presbiopia
(vista cansada). Dos noventa e seis milhões (96.000.000)
de necessitados de correção visual, apenas dezenove
milhões (19.000.000) conseguem compensar suas
dificuldades visuais. (Fonte:
www.filadelfianet.com.br/PatoBranco/o_que_e.htm
) – Acesso em 12-04-05.
Aproximadamente setenta e sete
milhões (77.000.000) de brasileiros não estão enxergando
adequadamente, neste momento, por falta de um simples
par de óculos. Apesar de triste, é fácil concluir que
são os menos favorecidos que se encontram nessa
situação.
O Óptico-optometrista, como
avaliador primário da função visual, pode mudar esse
quadro, resgatando a qualidade visual de nossos irmãos
brasileiros, principalmente os menos favorecidos que são
os mais prejudicados, universalizando o bem estar
visual.
Para finalizar, tais embates são
oportunos pois induz a sociedade a romper com o
paradigma da "normose" e procurando alternativas.
Categorias em crise, não é só privilégio de quem "cuida"
da visão. Muitos biólogos não admitem que professores
licenciados em Biologia tenham o registro no Conselho
Regional de Biologia. A medicina oriental chinesa (vê o
corpo como uma "totalidade" – leitura holística) ainda
sofre com o preconceito de médicos da cultura ocidental
com uma visão cartesiana, fragmentada e mecanicista, no
qual, a visão humana, é apenas competência do médico
oftalmologista. Nesse "fogo" cruzado, a sociedade mais
uma vez sai perdendo e, como sempre, assiste de
"camarote", outorgando poderes para políticos que,
muitas vezes esquecem da função social dos profissionais
da saúde, sob o prisma da multidisciplinaridade.